Olá Bernardo, Acabei de ler o teu livro há dias. Ao comentá-lo com quem mo recomendou, disse que quando pensamos num primeiro livro, pensamos numa escrita e numa obra pouco complexa e até básica. O teu livro não é assim, pelo contrário, está cheio de pormenores. A história é agradável, mas o que mais me prendeu, para ser sincera, foi a tua maneira de escrever e expressões e vocábulos como "avelhentou","desses que atravessam a vida pé ante pé", "salgalhada" e "círculo perfeito em torno de nada", entre algumas outras. É apenas uma muito humilde opinião. Ficamos à espera de mais! Bom trabalho e um beijinho, Alice
Meu caro amigo, aqui segue o prometido comentário, não sem antes alguns reparos de modéstia que o bom senso obriga:
- Não sou critico literário, mas faço-o com todo o respeito, orgulho e carinho que tenho por ti. Estou quase isento, pois ainda não li nenhuma critica ao teu livro, à excepção da apresentação pelo M.R.S.; - Não pretende ser mais que um comentário o mais assertivo possível sobre a tua prosa, e menos sobre o que conheço de ti; - Ler é um prazer pessoal que adoro partilhar, dos poucos. Reparto assim o meu entusiasmo contigo, e quando for longe de mais nas apreciações da tua arte, perdoas-me os excessos, mas será por entrega e encantamento a este capricho que me permites hoje.
Primeiro “erguer de sobrancelha”; um romance de época! Não o esperava, e é no mínimo corajoso. Por ser difícil e arriscado (creio que o prof. Marcelo já o referiu no que respeita à coerência das referências históricas, que aliás está bem conseguido), e por ser um género que exige alguma inteligência para não cair no injusto escalão démodé. Neste aspecto surpreendeste-me pela frescura “insana” das personagens, credíveis e descoladas da época do enredo. Senti o bucolismo do Alentejo e a mística única da velha Lisboa, e chegou para “colocar” os personagens. O resto fizeste, e de uma forma brilhante, com a forte metaforização que caracteriza toda a história e envolvência do Sebastião e Alfredo, e alguns arroubos “deliciosos” na profundidade psicológica destes dois principais. Por aqui acho que podias ter feito mais (puxando uma brasa egoísta à minha sardinha), e aliás a história do livro assim o merece, creio… E isto vem relacionado com o “erguer da sobrancelha” que me resta, a outra! Ao pensar que este é de facto o teu primeiro romance publicado, fico pasmo com a tua maturidade a escrever. Sei que tens outros na gaveta, o que indicia alguma prática, certo, mas esta riqueza de léxico, este correr de frases e ideias alinhavados (por vezes) “ao esquadro” mostra obstinação, método e uma fluência artística que muito admiro. O talento está confirmado! E para despedir alguns tabus, não achei o livro maçudo, lê-se de uma assentada (comigo foram 3 ou 4 viagens de Alfa muito bem passadas), os personagens são sólidos e não estão em excesso de modo algum.
Um ultimo comentário; perdoa-me o atrevimento, mas reconheço um piscar de olho a alguma utilidade comercial que sentes necessária (lá estou eu a não cumprir a minha promessa de manter-me neutro à pessoa B.Rodo) não por algum demérito literário, mas por achá-lo cortado onde poderia florescer, limitado onde queria infinito, negro e poeirento onde vi limpinho. E tão fácil que é cacarejar do alto do meu poleiro arrogante! Mas pelo que te conheço, acredito em algo mais em ti que não o vi nestas páginas. Não sei se o escondeste, eliminaste, ou guardaste para o baile seguinte. Eu espero, porque mereces muito mais que um reconhecimento editorial, deves também ter admiradores, leitores e um reconhecimento intelectual honesto que te ofereço, mais um de muitos que certamente virão.
Em suma, muito mais que um teste, uma certeza! Escreveste literatura, o que só por si é de louvar nos dias que correm. Claro que outra coisa não esperava (aliás nem tinha estômago para terminar o teu livro se assim não o fosse) mas olhando para os “top” de vendas das FNAC’s e homólogas (histórias de vampiros e lixo não reciclável de estrelas televisivas) fico deprimido pelo voto à insignificância que tantos autores entusiasmantes recebem. Vais ter de ter estômago tu para digerires os sapos portugueses que por aí andam, mas creio não estar a vender-te nenhuma novidade.
E ainda um desafio, um devaneio egoísta que queria de ti para um próximo livro (sim, estou e levar o meu êxtase aos limiares do razoável): um narrador homodiegético, mais diálogos, personagens improváveis, paisagens urbanas, imundície organizada, putas inteligentes, homens abjectos, animais que pensam (melhor que) o homem, um escritor falhado. Fácil não? Acredito que vais conseguir!
Nasci em 1976, em Lisboa. Sou formado em Comunicação Empresarial. O meu percurso profissional passou pela publicidade e consultoria de marketing e presentemente sou responsável pela unidade de media digital do OmnicomMediaGroup.
bernardorodo@hotmail.com
Olá Bernardo,
ResponderEliminarAcabei de ler o teu livro há dias. Ao comentá-lo com quem mo recomendou, disse que quando pensamos num primeiro livro, pensamos numa escrita e numa obra pouco complexa e até básica. O teu livro não é assim, pelo contrário, está cheio de pormenores.
A história é agradável, mas o que mais me prendeu, para ser sincera, foi a tua maneira de escrever e expressões e vocábulos como "avelhentou","desses que atravessam a vida pé ante pé", "salgalhada" e "círculo perfeito em torno de nada", entre algumas outras.
É apenas uma muito humilde opinião. Ficamos à espera de mais!
Bom trabalho e um beijinho,
Alice
Meu caro amigo, aqui segue o prometido comentário, não sem antes alguns reparos de modéstia que o bom senso obriga:
ResponderEliminar- Não sou critico literário, mas faço-o com todo o respeito, orgulho e carinho que tenho por ti. Estou quase isento, pois ainda não li nenhuma critica ao teu livro, à excepção da apresentação pelo M.R.S.;
- Não pretende ser mais que um comentário o mais assertivo possível sobre a tua prosa, e menos sobre o que conheço de ti;
- Ler é um prazer pessoal que adoro partilhar, dos poucos. Reparto assim o meu entusiasmo contigo, e quando for longe de mais nas apreciações da tua arte, perdoas-me os excessos, mas será por entrega e encantamento a este capricho que me permites hoje.
Primeiro “erguer de sobrancelha”; um romance de época! Não o esperava, e é no mínimo corajoso. Por ser difícil e arriscado (creio que o prof. Marcelo já o referiu no que respeita à coerência das referências históricas, que aliás está bem conseguido), e por ser um género que exige alguma inteligência para não cair no injusto escalão démodé. Neste aspecto surpreendeste-me pela frescura “insana” das personagens, credíveis e descoladas da época do enredo. Senti o bucolismo do Alentejo e a mística única da velha Lisboa, e chegou para “colocar” os personagens. O resto fizeste, e de uma forma brilhante, com a forte metaforização que caracteriza toda a história e envolvência do Sebastião e Alfredo, e alguns arroubos “deliciosos” na profundidade psicológica destes dois principais. Por aqui acho que podias ter feito mais (puxando uma brasa egoísta à minha sardinha), e aliás a história do livro assim o merece, creio… E isto vem relacionado com o “erguer da sobrancelha” que me resta, a outra! Ao pensar que este é de facto o teu primeiro romance publicado, fico pasmo com a tua maturidade a escrever. Sei que tens outros na gaveta, o que indicia alguma prática, certo, mas esta riqueza de léxico, este correr de frases e ideias alinhavados (por vezes) “ao esquadro” mostra obstinação, método e uma fluência artística que muito admiro. O talento está confirmado! E para despedir alguns tabus, não achei o livro maçudo, lê-se de uma assentada (comigo foram 3 ou 4 viagens de Alfa muito bem passadas), os personagens são sólidos e não estão em excesso de modo algum.
Um ultimo comentário; perdoa-me o atrevimento, mas reconheço um piscar de olho a alguma utilidade comercial que sentes necessária (lá estou eu a não cumprir a minha promessa de manter-me neutro à pessoa B.Rodo) não por algum demérito literário, mas por achá-lo cortado onde poderia florescer, limitado onde queria infinito, negro e poeirento onde vi limpinho. E tão fácil que é cacarejar do alto do meu poleiro arrogante! Mas pelo que te conheço, acredito em algo mais em ti que não o vi nestas páginas. Não sei se o escondeste, eliminaste, ou guardaste para o baile seguinte. Eu espero, porque mereces muito mais que um reconhecimento editorial, deves também ter admiradores, leitores e um reconhecimento intelectual honesto que te ofereço, mais um de muitos que certamente virão.
Em suma, muito mais que um teste, uma certeza! Escreveste literatura, o que só por si é de louvar nos dias que correm. Claro que outra coisa não esperava (aliás nem tinha estômago para terminar o teu livro se assim não o fosse) mas olhando para os “top” de vendas das FNAC’s e homólogas (histórias de vampiros e lixo não reciclável de estrelas televisivas) fico deprimido pelo voto à insignificância que tantos autores entusiasmantes recebem. Vais ter de ter estômago tu para digerires os sapos portugueses que por aí andam, mas creio não estar a vender-te nenhuma novidade.
E ainda um desafio, um devaneio egoísta que queria de ti para um próximo livro (sim, estou e levar o meu êxtase aos limiares do razoável): um narrador homodiegético, mais diálogos, personagens improváveis, paisagens urbanas, imundície organizada, putas inteligentes, homens abjectos, animais que pensam (melhor que) o homem, um escritor falhado. Fácil não? Acredito que vais conseguir!
Um abraço!
Tiago